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Eduardo Giannetti estimula a imaginar a própria morte em ensaios sobre finitude 8646a

Por ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER / Folhapress

02 de junho de 2025, às 16h24

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Você já imaginou a sua própria morte? O economista e ensaísta Eduardo Giannetti estimula que o faça.

“O último suspiro, a preparação do corpo, o velório, a cerimônia de cremação, a dispersão das cinzas no mar, conforme o seu desejo; quem chorou, quem dissimulou, quem sumiu; a possibilidade de checar, sem ser visto, se a sua ausência foi (ou não) sentida -e por quem?”

E para quem pensa na morte como o “nada absoluto”, é possível vislumbrá-la em termos que não sejam especulativos? Afinal, “como pode alguém consciente conceber a realidade da absoluta inconsciência ou ausência de si?”

Por que Giannetti está falando sobre isso agora? De onde vem a insubmissão à finitude humana? Spoiler: não são só os religiosos que se rebelam contra essa ideia, não. Há muita oposição secular a ela também.

Aos 68 anos, ele reconhece à reportagem que “a idade dá uma perspectiva”. Fora que “ver pessoas muito queridas desaparecendo também suscita uma inquietação muito grande”. Pode ser, pode ser.

Também é presumível que tenha algo a ver com seu pai não deixar que ele dormisse com o abajur ligado. “Ele proibia, o que talvez tenha estimulado uma reflexão um pouco mais angustiada.” A escuridão no quarto era o “terror soberano” do menino Eduardo.

Tudo isso vira matéria-prima para “Imortalidades”, livro que Giannetti publica no formato de microensaios. O autor pera em 432 páginas suas reflexões sobre este tema definitivo para a experiência humana.

Em uma hora, ele discorre sobre a “imortadigitalização”, que busca driblar o apodrecimento da carne com inteligência artificial, medicina regenerativa, terapia genética e grande elenco científico. Em outra, discute “a demolição da solução religiosa para o enigma do após-a-morte”, porque vai que Freud explica.

Sigmund Freud via a religião como um colchão que amortece a inevitabilidade que é morrer. Uma ilusão, sobretudo.

O psicanalista já tinha 70 anos e lidava com um câncer no maxilar quando, em rara entrevista, respondeu se acreditava que, “de alguma forma que seja”, nossa personalidade permanece após morrermos. Respondeu que não pensava nisso. “Tudo que vive perece. Por que deveria o homem ser uma exceção?”

Logo ele, que havia criado a psicanálise e prescrito que “no inconsciente, cada um de nós está convencido da sua imortalidade”, era indiferente ao desejo de ser imortal? “Pelo que me toca, estou perfeitamente satisfeito em saber que o eterno aborrecimento de viver finalmente ará”, reagiu.

Não surpreende que àquela altura da vida Freud “declare-se farto da existência”, diz Giannetti. Mas o ensaísta também não vê muito mérito em desdenhar dessa fonte de angústia que é nossa condição mortal. A tentativa de superar a morte biológica, argumenta, “não é um artefato da doutrinação religiosa, ainda que tenha sido sequestrado, monopolizado e moldado por ela”.

Giannetti experimentou na infância um “anêmico catolicismo de terço, apostila e catecismo”. Nada que o tenha convencido. Conta que não endossa nenhuma religião institucionalizada. Ainda assim, “as questões que realmente importam para mim estão comumente associadas à religiosidade”, diz.

O ateu, inclusive, pode padecer do mesmo dogmatismo que o mais crédulo dos crentes, afirma. O cientismo, que chama de “doença infantil da ciência”, se põe acima de outras formas de decodificar a realidade, como a religião. “Quando, por questões empíricas e lógicas, a ciência não tem nada a dizer sobre o que vem depois da morte.”

“A desilusão ateia”, afirma o autor, é sacar que “a morte de Deus não abole o mistério, recrudesce-o”.

Sobre a idealização de uma justiça póstuma, o tal julgamento final que recompensaria uma vida terrena virtuosa, resgata palavras atribuídas ao imperador romano Marco Aurélio: “Seria bom morrer, se houver deuses; triste viver, se não houver nenhum”.

São muitas as abas que Gianetti abre nesta nova obra, e muitas as fontes das quais bebe. Tanto o brasileiro Machado de Assis quanto o argentino Jorge Luis Borges escreveram contos intitulados “O Imortal”, o que não lhe a batido.

De Carlos Drummond de Andrade, pesca o poema “Homenagem”, que entrelaça os nomes de dez autores suicidas que “escolheram o dia, a hora, o gesto, o meio, a dis-solução”: Walter Benjamin, René Crevel, Hart Crane, Vachel Lindsay, Jack London, Cesare Pavese, Raul Pompeia, Sá-Carneiro, Virginia Woolf, Stefan Zweig.

Aproveita Giannetti para sugerir a reunião de pensadores e escritores que possivelmente morreram virgens: Tomás de Aquino, Álvares de Azevedo, Borges, Emily Dickinson, Hobbes, Kant, Kierkegaard, Leopardi, John Stuart Mill, Newton, Pascal, Fernando Pessoa, Antero de Quental, Ruskin, Adam Smith e Simone Weil. “Nenhum deles, por tudo que sabemos, conheceu o dia, a hora, o pique, o ato da dis-seminação.”

Por outro lado, também não esquece que “a língua sa tem um nome sugestivo para o orgasmo”: la petite mort -a pequena morte.

IMORTALIDADES

Preço R$ 89,90 (432 págs.); R$ 44,90 (ebook)

Autoria Eduardo Giannetti

Editora Companhia das Letras

Lançamento Nesta terça (3), às 19h, na Livraria da Travessa do shopping Iguatemi, em São Paulo

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